Quando uma criança passa a frequentar a escola, uma miríade de oportunidades se abre. A possibilidade de aprender a ler, escrever, despertar novos interesses e ganhar novos interesses é definitiva na vida de todos os cidadãos, e também na sociedade na qual vivem. Quando fazemos um recorte por gênero, a educação tem um poder ainda mais transformador para as meninas e mulheres.
Num mundo que ainda patina na igualdade de gênero, elas continuam sua luta por direitos fundamentais. Em um levantamento realizado em 2017, o movimento Todos Pela Educação mostrou que 43% das meninas brasileiras de 14 a 17 abandonaram os estudos por estarem grávidas, serem responsáveis pelos afazeres domésticos ou do cuidado com filhos, irmãos menores ou idosos.
Diz o mesmo estudo que, numa comparação com a mesma faixa etária do gênero masculino, apenas 0,4% abandonaram os estudos por serem responsáveis pelo cuidado de alguém.
O mesmo problema é enfrentado por outros países pobres ou em desenvolvimento, na América Latina, na Ásia e na África. Nestes lugares, muitas das meninas acabam sendo deixadas de lado por terem de focar-se em tarefas domésticas e sofrerem mais discriminação, passando a ter menos oportunidades de crescimento pessoal e profissional.
O impacto de uma menina fora da escola também leva a um aumento da mortalidade de adolescentes e crianças, que por falta de conhecimento, acabam não tendo informações básicas sobre saúde. Da mesma forma, quanto mais meninas e mulheres acessarem a educação, desenvolvendo mais independência, senso crítico, saúde e consciência social, melhor será a vida de uma comunidade, de uma cidade ou de um país.
Foi a partir destas constatações que o post de hoje traz o perfil de 8 mulheres do Brasil e de outras origens que, no passado e na atualidade, dedicaram-se a fazer da luta pela educação feminina uma demanda a que o mundo deveria estar mais atento. Conheça ou relembre-as a seguir:
Maria Guilhermina Loureiro de Andrade
Nascida em Ouro Preto, em 1842, Maria Guilhermina fundou a primeira escola de professoras de jardim da infância do Brasil. Era de uma família de professoras, mas diferentemente de sua mãe e irmãs, destacou-se também por seu ativismo a favor de uma educação mais inclusiva, num momento em que poucas mulheres frequentavam a escola.
A família Loureiro de Andrade foi proprietária do Colégio Andrade, instituição particular na cidade Rio de Janeiro, que esteve ativa entre as décadas de 1870 e 1920. Nesta época havia poucas escolas que formavam professores, e para ter acesso a uma formação profissional melhor, Maria Guilhermina, cuja família tinha recursos, foi estudar em Nova York, onde teve contato com a metodologia dos jardins de infância, uma proposta de educação infantil ainda não presente no Brasil de então.
Quando voltou ao Brasil, Maria Guilhermina decidiu reestruturar a escola da família para oferecer um curso de formação de “jardineiras”, as professoras da educação infantil, que foi o pioneiro do país. Em paralelo, ela propôs melhorias no sistema escolar por meio de matérias em jornais e revistas, tomou parte da criação da Associação dos Professores do Brasil e tornou-se um nome fundamental quando se fala da inclusão feminina pelo acesso à educação.
Nísia Floresta
Nascida em 1810 no Rio Grande do Norte, Nísia foi educadora, escritora, feminista e abolicionista. É conhecida como pioneira da educação feminista no Brasil e uma defensora da igualdade de gênero. Era filha de pai português e mãe brasileira e estudou em um convento de carmelitas em Pernambuco, o que foi fundamental em sua formação pessoal e profissional, e seu futuro interesse pela educação.
Num momento do país em que as mulheres tinham escasso acesso à educação formal, Nísia chegou ao Rio de Janeiro em 1938 e, neste mesmo ano, fundou o Colégio Augusto, que além de preparar as meninas para as “obrigações do futuro matrimônio”, oferecia aulas de história, religião, educação física, artes, geografia, literatura e ciências.
A abertura da instituição foi muito criticada pela sociedade da época, que considerava a educação da mulher como desnecessária e, muitas vezes, escandalosa, uma vez que o sexo feminino era visto como destinado apenas ao casamento, maternidade e trabalho doméstico.
Além de seu trabalho como educadora, Nísia escreveu mais de 15 livros e centenas de artigos defendendo o direito das mulheres e dos índios, a libertação dos escravos, e esteve durante toda a sua vida à frente de questões urgentes em sua época, tornando-se uma das mais importantes mulheres ativistas brasileiras.
Antonieta de Barros
Professora, jornalista, ativista pelo amplo direito à educação e da valorização da cultura negra, além de primeira mulher negra eleita no Brasil como deputada estadual, o nome de Antonieta de Barros é carregado de pioneirismo.
Nascida em Florianópolis em 1901, Antonieta também lutou contra o machismo e o racismo predominantes em seu estado natal.
Cursou a Escola Normal Catarinense, e após a formatura, criou um curso para alfabetizar a população carente, em 1922. O curso, batizado com o nome de Antonieta, acontecia em sua própria casa, e ela se dedicou a ele durante toda a sua vida. Foi também docente na Escola Complementar, no Colégio Coração de Jesus e também na mesma Escola Normal Catarinense que a teve como aluna, onde também foi diretora.
Além da atuação na educação, Antonieta foi jornalista e, em seus artigos e reportagens, tratava de temas como desigualdade racial e de gênero. Ela fundou o jornal A Semana, dirigiu a revista Vida Ilhoa e, sob o pseudônimo Maria da Ilha, escreveu o livro Farrapos de Ideias.
Dois anos depois da conquista do voto feminino no Brasil (1932), Antonieta tornou-se suplente do engenheiro Leônidas Coelho de Souza, candidato pelo Partido Liberal Catarinense (PLC). Como Leônidas não pode assumir o cargo, Antonieta o fez e cumpriu o mandato de 1935 a 1937. Ela foi a primeira deputada de Santa Catarina e a primeira representante negra numa câmara estadual no Brasil.
Bertha Lutz
Foi uma das figuras mais significativas do feminismo e da educação no Brasil do século XX no Brasil. Uma das primeiras mulheres a ingressarem no serviço público federal e defensora dos direitos feminino ao voto e ao ensino superior, Bertha nasceu em São Paulo, em 1894.
Seus pais eram o cientista Adolfo Lutz e a enfermeira inglesa Amy Fowler, que a incentivaram a seguir seus estudos. Em 1918, ela formou-se em Biologia na Universidade de Sourbonne, em Paris, onde teve contato com a primeira onda do feminismo e, de volta ao Brasil, resolveu colocar em prática o que observou na Europa.
Em 1924, ao lado de outras feministas, Bertha fundou a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) para lutar pelos direitos civis e políticos das mulheres. A FBPF teve conquistas como a criação da União Universitária Feminina, a permissão do ingresso de meninas no Colégio Pedro II — um dos mais tradicionais do Rio de Janeiro —além de lutar pela criação de leis de proteção à mulher e à criança, e a garantia feminina ao voto.
Ela também foi a representante brasileira na Assembleia-Geral da Liga das Mulheres Eleitoras, nos Estados Unidos, sendo eleita vice-presidente da Sociedade Pan-Americana, em 1922. O direito ao voto seria garantido às mulheres apenas 10 anos depois, por decreto do presidente Getúlio Vargas.
Bertha foi também uma das primeiras mulheres na política brasileira, tendo assumido como suplente no lugar de Cândido Pessoa, que havia falecido. Como deputada, defendeu propostas como mudanças na legislação referente ao trabalho das mulheres e das crianças (que naquela época eram obrigadas a ganhar dinheiro para ajudar suas famílias), e a igualdade salarial.
Até sua morte, em 1976 aos 84 anos, Bertha seguiu defendendo os direitos das mulheres e meninas, em cargos públicos ou como ativista.
Malala Yousafzai
Nascida em uma família onde a educação era muito valorizada — seus pais eram donos de uma escola em Mingora, no Paquistão — Malala ficou conhecida pelo blog “Diário de uma Estudante Paquistanesa”, feito a pedido da BBC, no qual falava sobre a rotina e as dificuldades das mulheres na escola sob o pseudônimo Gul Makai, uma heroína do folclore local.
O blog chamou a atenção para as questões levantadas pela adolescente, mas também atraiu o ódio dos radicais talibãs, grupo extremista com forte presença no país de Malala e no vizinho Afeganistão. O grupo forçou o encerramento de escolas públicas e proibiu a educação de meninas entre 2003 e 2009, e recentemente voltou a tomar o comando afegão, causando grande temor na comunidade internacional.
Numa tarde de 2012, a menina foi baleada na cabeça por um dos homens do Talibã, ao voltar da escola. A bala atravessou seu crânio e Malala batalhou pela vida durante dias, até ser transferida para um hospital em Birmingham, na Inglaterra.
O atentado contra sua vida comoveu o mundo, e ela passou a ser uma das vozes mais ativas na defesa da educação das meninas. Por este ativismo aguerrido, Malala tornou-se a pessoa mais jovem a receber o prêmio Nobel da Paz em 2014, aos 17 anos.
Determinada a continuar sua luta pelos direitos das meninas a uma vida melhor por meio da educação, Malala ingressou na Universidade de Oxford, onde estudou filosofia, política e economia até 2020. Durante este período, ela criou o Malala Fund, organização que tem o objetivo de promover a educação de meninas no mundo.
Desde 2018, três ativistas brasileiras foram apoiadas pelo Malala Fund: Sylvia Siqueira Campos, do Movimento Infanto-juvenil de Reivindicação (Mirim, do Recife; Ana Paula Ferreira de Lima, da Associação Nacional de Ação Indigenista (Anaí), em Salvador, e Denise Carreira, da Ação Educativa, em São Paulo. Todas elas trabalham com causas relacionadas à educação de meninas em áreas de risco social.
Zainan Salbi
Nascida em 1969 em Bagdá, Zainan teve sua vida afetada por sua experiência na guerra, durante o conflito Irã-Iraque, assim como pelo medo imposto por Saddam Hussein à sua família. Seu pai era o ex-piloto pessoal do já falecido presidente iraquiano, além de chefe da aviação civil do país. Para que a filha pudesse migrar, enviou-a aos Estados Unidos por meio de um casamento arranjado, com um iraquiano mais velho.
O casamento rapidamente tornou-se abusivo, e ela escapou três meses depois de casa, mas não conseguiu voltar ao Iraque. Era a época da Primeira Guerra do Golfo, que aconteceu apenas alguns meses após sua chegada aos Estados Unidos, em 1990.
A experiência de Zainan com a guerra a sensibilizou para a situação das mulheres envolvidas em conflitos em todo o mundo. Quando teve contato com a guerra na Bósnia e Herzegovina, alguns anos após sua chegada à América do Norte, ela decidiu fundar a Women for Women International, organização oferecer a milhares de mulheres e meninas em áreas de risco de guerra recursos e apoio para reconstruir suas vidas, famílias e comunidades.
Ann Cotton
Nascida em 1950 no Reino Unido, Cotton é fundadora e membro do conselho da Campaign for Female Education (CAMFED), uma organização internacional sem fins lucrativos que luta contra a pobreza e a desigualdade na África subsaariana, apoiando meninas a seguirem seus estudos.
A CAMFED também capacita mulheres jovens a se tornarem líderes de mudança em suas comunidades, por meio de mentorias e programas de formação especiais para cada país.
Ann ganhou vários prêmios por seu trabalho, incluindo um Doutorado Honorário em Direito da University of Cambridge e na The Open University. Ela também é membro do conselho da Girls not Brides, uma iniciativa que luta contra o casamento infantil de meninas em todo o mundo.
Angelique Kidjo
Nascida no Benin em 1960, Kidjo é uma cantora e compositora famosa em todo o mundo. Mas para além de sua notável carreira na música e nas artes (também é atriz, produtora e diretora), ela também se notabilizou por seu trabalho humanitário em prol das meninas africanas.
Embaixadora da Boa Vontade do Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, na sigla em inglês) da África Ocidental, Kidjo é uma das líderes da Fundação Batonga, que capacita mulheres e meninas na África por meio do ensino médio e superior.
A fundação trabalha para melhorar a infraestrutura escolar, aumentar o número de matrículas, concede bolsas de estudo e fornece apoios e microcréditos para famílias de bolsistas.
Professor e professora: compartilhe conosco como tem incentivado suas estudantes a seguirem firme nos estudos.
Para saber mais: http://institutosingularidades.edu.br/novoportal/
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