A professora e pesquisadora Marisa Lajolo provoca-nos sempre com a afirmação de que literatura não é literatura, se ficar fechada numa gaveta. Essa declaração refere-se à publicação de textos que são produzidos e não circulam, mas o que dizer sobre o ensino de literatura brasileira contemporânea nas escolas?
Será que mesmo com tantas produções, autores, publicações, premiações etc. não a estamos colocando no fundo de uma gaveta e a esquecendo? Basta fazermos um rápido exercício de reflexão: quais autores desse segmento eu já li? Quantos foram abordados em minha atuação profissional, seja em sala de aula ou em cursos de formação, seja como pesquisador?
Qualquer pessoa que você questionar sobre o assunto, é provável que a resposta esteja na ponta da língua: “nenhum, não conheço nenhum!”, será a mais provável. Então, pensando na escola, se ela é um espaço de socialização do conhecimento, porque nos distanciamos tanto da atualidade quando falamos de literatura brasileira? Por qual motivo sempre abordamos e estudamos, preferencialmente os “clássicos” da literatura?
E, novamente, sem muito esforço, chegaremos a respostas como: “eles são mais importantes!”, “eles são leitura de vestibular!”. Mas essas respostas prontas caem por terra, quando pensamos que não precisa ser “clássico” para ser bom! Sergio Vaz, Marcelino Freire, Jarid Arraes, Conceição Evaristo, Ana Cristina César, Luiz Ruffato, Julián Fuks, entre muitos outros, estão aí para provar que a literatura contemporânea não deixa nada a desejar, em relação aos nomes consagrados de nossa produção literária.
E sobre o vestibular? Bernardo Carvalho, com a obra premiada Nove Noites, esteve na lista deste ano, por exemplo?
Portanto, qual o motivo de a literatura contemporânea continuar tão ausente das salas de aulas? Este texto não busca respostas, busca fazer provocações e gerar questionamentos…
A literatura contemporânea, entre tantas características que possui, tem uma fundamental: sua linguagem singular. A linguagem presente nestes textos é sempre muito próxima da realidade de nosso estudante – geralmente, é uma linguagem coloquial, direta, oralizada e popular.
Trabalhar com este tipo de texto não só desperta prazer no discente, mas também algo que nos parece imprescindível para a efetividade do processo educativo: a identificação. Se eu me identifico com algo, passo a me interessar, a interagir, sinto-me notado e provocado!
Desse modo, cai por terra a afirmação, muito comum entre alguns professores, de que os textos literários têm uma linguagem truncada, inacessível, e, por esse motivo, os estudantes não se interessam.
Assim, diante de uma realidade cada vez mais complexa, veloz, interativa e desafiadora, por que não ensinarmos a literatura brasileira contemporânea? Por que não nos desafiarmos a ler, consumir e conhecer essa literatura?
Argumentos não faltam: primeiro, trata-se de textos prazerosos, variados, inquietantes; segundo, ela se encaixa perfeitamente em várias competências gerais da BNCC, entres elas, aquela vinculada ao “conhecimento, repertório cultural e pensamento crítico/criativo”;terceiro, a maioria dos autores está viva e próxima do(s) leitor(es), estabelecendo com seu púbico uma relação dialógica e acolhedora.
Na nossa graduação em Letras, trabalhamos com vários destes autores, discutindo suas obras com os alunos, apresentando-lhe outros olhares e formas de interpretar diferentes realidades. Uma amostra deste trabalho – e uma maneira de compartilhar com outros educadores estas novas vozes literárias – pode ser conferida na série #LetrasIndica, que é postada semanalmente no Instagram do Singularidades.
E então? O que estamos esperando para ler estes textos? O que estamos esperando para ensinar esses textos? Bem, como dissemos no início deste artigo, o objetivo dele é provocar! Desse modo, finalizamos nossa provocação com um dos poetas mais geniais desta geração, Antônio Carlos de Britto (Cacaso):
HAPPY END
o meu amor e eu
nascemos um para o outro
agora só falta quem nos apresente
O que você está esperando para se apresentar à rica e diversa Literatura Brasileira Contemporânea?
Márcia Moreira Pereira é graduada em Letras: Português-Inglês, possui pós-graduação lato-sensu em Tradução: Inglês-Português e é mestra em Educação pela Universidade Nove de Julho (Uninove). É doutora em Letras na Universidade Presbiteriana Mackenzie (Uni-Mackenzie) e professora da licenciatura em Letras do Instituto Singularidades.
Como você apresenta novos autores e estimula seus alunos a se interessar mais pela produção literária contemporânea brasileira? Conte para a gente?
Para saber mais: www.institutosingularidades.edu.br
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