O senso comum faz com que pensemos sempre a educação como um processo que acontece num ambiente urbano, e nos afasta da imagem das escolas rurais, ribeirinhas, localizadas em aldeias indígenas, assentamentos ou mesmo em quilombos. Desta forma, ignora-se neste retrato superficial a representatividade destas comunidades no todo da sociedade brasileira, e sua contribuição para fazer do país um lugar mais justo e igualitário.
A disciplina “Prática de Ensino: Educação do Campo” faz parte das matrizes curriculares tanto da licenciatura em Letras como em Matemática do Instituto Singularidades. Conversamos com o professor Fernando Bianco Solano sobre os temas estudados e os objetivos da matéria, além de sua contribuição para o ensino da matemática. Confira na entrevista a seguir.
Qual o objetivo da disciplina?
A disciplina tem como escopo preparar os futuros educadores e educadoras para a atuação no contexto educacional do campo (que engloba o trabalho com assentados, acampados, ribeirinhos, povos da floresta, quilombolas e caiçaras), respeitando as particularidades sociais, políticas e culturais de cada população.
Nas suas últimas vivências, qual o conhecimento que a média dos alunos tinham destas distintas realidades dos indígenas, comunidades caiçaras e ribeirinhas, e moradores da zona rural e quilombolas?
A maior parte dos graduandos desconheciam os dilemas que envolvem historicamente a atividade docente nas realidades apontadas. No entanto, tínhamos uma aluna que possuía uma experiência docente em um assentamento do Movimento Sem Terra (MST), e acabou contribuindo muito com as discussões, compartilhando a sua vivência.
Quais as atividades são realizadas ao longo do curso, em sala de aula e fora dela?
Ao longo do curso desenvolvemos várias atividades de aprofundamento teórico, a partir diferentes gêneros textuais e vídeos, que fundamentaram construtivos debates. Inicialmente tínhamos previsto uma visita ao Assentamento Irmã Alberta do MST, para conhecermos as especificidades do ensinar e aprender nesse contexto, mas o delicado contexto político impediu a visita.
Quais diferenças fundamentais você identifica, como professor, na realidade de cada um destes grupos? E as semelhanças?
Cada comunidade é única, mesmo em contextos parecidos sempre há especificidades que devem ser consideradas, mas as principais diferenças estão no modo de produção, que reverbera na organização social e cultural. A semelhança fica por conta da fragilidade econômica e a necessidade de politicas públicas que reforcem o respeito às identidades dessas comunidades.
Os professores que exercem a docência nestas comunidades nem sempre conhecem a maneira de comunicar-se com elas, seus costumes, suas tradições e nem tampouco seus valores. O curso pretende também cobrir esta lacuna?
A aproximação com as especificidades de cada comunidade deve ser uma prática não apenas no contexto da educação do campo, mas também da urbana, pois cada unidade educacional está inserida em um território que apresenta particularidades que precisam ser consideradas no planejamento das aulas.
Entretanto, a histórica reprodução do modelo educacional da cidade em realidades rurais demanda a formação de educadoras e educadores preparados para entender, respeitar e incorporar as nuances políticas, sociais e culturais de cada comunidade.
No caso do raciocínio matemático, ele se insere no curso de que forma?
A partir do mergulho nas especificidades de cada comunidade e nas políticas públicas que alicerçam a atividade educacional do campo, o futuro professor de matemática estará preparado para fazer as adequações didáticas das situações de aprendizagem propostas, alinhando o vocabulários e os exemplos trabalhados em sala de aula e tornando o processo significativo.
Imagine o professor propondo um trabalho que aborde o cálculo da produção rural familiar, o calendário de plantio e colheita, as unidades de peso e volume com foco no látex extraído por seringueiros, a utilização das unidades de comprimento para a mensuração de lotes: tudo isso torna os conteúdos significativos para os alunos.
Como professor, qual o seu objetivo ao final do curso?
Esperamos que o futuro professor tenha a preocupação de pensar no seu plano de ensino a partir da realidade da comunidade, respeitando a dinâmica local, e trazendo para a sala de aula problemas reais do território, potencializando as características da comunidade na direção da resolução de problemas cotidianos.
Fernando Bianco Solano é professor das licenciaturas de Letras e Matemática do Instituto Singularidades
Para saber mais: http://institutosingularidades.edu.br/novoportal/
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