Um tema que felizmente vem ganhando mais atenção nos últimos anos é a inclusão de pessoas com deficiência, como cegueira, baixa visão, surdez total ou parcial e outras modalidades físicas. Segundo o último Censo, no Brasil, esse público corresponde a 45 milhões de pessoas que, pouco a pouco, veem suas vidas melhorar com políticas e medidas de acessibilidade, como o ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras), inclusão de janelas de tradução de libras em filmes e programas na televisão, recursos em Braile em instituições públicas e privadas e, por fim, uma internet que inclua todos.
Numa conversa sobre este tema realizada no Instituto Singularidades, Suzeli Rodrigues, coordenadora do movimento Web para Todos, comentou que a comparação com as barreiras físicas, como rampas para os cadeirantes e ausência de intérpretes de libras em eventos, com o que se encontra na internet é uma constante em seu trabalho.
“Tem muitas barreiras que são da área de conteúdo, mesmo, como a falta de legenda em vídeo, ou frases que são escritas de uma forma que não podem ser compreendidas facilmente, ou não considerar pessoas que tenham baixa visão ou cegueira nesta navegação”, exemplifica.
Tiago Codogno Bezerra, professor do Instituto Singularidades nos cursos de graduação e na pós-graduação em Tradução e Interpretação de Libras – Português, é idealizador do curso on-line Comunique-se em Libras, juntamente com a professora Carla Sparano. Ele afirma que, mesmo que nos números do IBGE apontem para 3 milhões de surdos brasileiros, há que levar-se em conta as diferenças que existem dentro deste grupo.
“Como a Suzeli comentou, oferecer a web para todos é dar caminhos para que os surdos também possam navegar com mais facilidade por peças de teatro, filmes, ou mesmo atendimentos médicos. Os lugares precisam estar acessíveis para propiciar autonomia, sem precisar ficar na companhia de um amigo ouvinte. Este indivíduo precisa se sentir livre. Então, a acessibilidade é muito importante”, salienta o professor.
Tiago conta que, como professor surdo, ele precisa de materiais digitais acessíveis, como o computador e a projeção, para que o ouvinte possa visualizar melhor o sinal e aprender. “O educador acaba usando o recurso da legenda, porque às vezes o filme vai estar com um ator surdo representando e ele estará usando a língua de sinais, o que deixará as pessoas perdidas. Então a gente já tem essa preocupação de colocar a acessibilidade para os ouvintes, que no caso seria a legenda”, explica.
O professor comenta que, no caso de alunos que tenham como foco melhorar a fluência em libras, ele retira a legenda, mas se não, prefere deixar isso acessível para que essa comunicação flua melhor, gerando trocas mais ricas em sala de aula.
Do ponto de vista dos sites e aplicativos, Suzeli comenta que o movimento Web para Todos vem percebendo a falta de conhecimento em relação ao universo da deficiência no Brasil. “No último Censo, o IBGE disse que são 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência no país. São quase 7 milhões de pessoas com baixa visão e cegueira, quase 10 com deficiência auditiva ou surda e 13 milhões com algum tipo de deficiência motora. Hoje no país, apenas 6% dos sites são acessíveis, ou seja, essas pessoas conseguem acessá-los, fazer uma compra, se informar ou se divertir. Enfim, é uma porcentagem muito pequena”, avalia a coordenadora.
Suzeli relata que há uma grande incompreensão por parte de muitas empresas, que, por exemplo, não entendem porque um surdo não consegue acessar um site se ele enxerga, ou que ignoram o fato de que pessoas com cegueira ou baixa visão também utilizam a internet.
“Percebemos que há uma falta de conhecimento muito grande sobre quem são essas pessoas, quais são seus desejos e como elas vivem. O que elas devem, querem e podem é fazer tudo o que todo mundo faz na internet. A essência dela, quando ela foi criada lá atrás, era a acessibilidade”, conta.
Como quebrar esses preconceitos e propor novas ações?
Suzeli comenta que existem muitos mitos relacionados à aplicação de ferramentas de acessibilidade nos sites: que é difícil fazer, de que vai ficar feio, de que é muito caro, e nada disso é verdadeiro. “É apenas um site ou aplicativo do jeito que é feito hoje, tendo a visão e o conhecimento para fazê-lo de forma que seja percebido e compreendido por todo mundo”, pontua.
Relacionando as falas de Suzeli com o seu trabalho no Instituto Singularidades, Tiago comenta que existe a preocupação com a formação dos alunos e também com professores que precisam conhecer não só o universo dos ouvintes, mas também o dos surdos, para aprender a lidar com diferentes formas de trabalho, o que tem aumentado.
“Nós temos alguns problemas que ficam obscuros. A gente ainda está no processo de informação, de trabalho, e isso se dá com as pessoas. Então, temos aqui a formação acadêmica e depois ele vai experenciar isso lá fora, como o universo bilíngue, como que é trabalhar com inclusão, então nós temos essa vertente, ainda. Isso é muito mais importante que ter essa formação, ter o diploma: é conhecer, ter contatos em várias áreas”, analisa.
Tiago comenta que mesmo com tanta novidade e avanços, há ainda muita informação fechada ou limitada ao surdo. “Então as pessoas têm muito esse mito ‘ai, o surdo não pode,’ ‘não dá,’ ‘não dá para ir ao teatro,’ ‘não dá para acessar o cinema’. Tudo isso é inverdade e nós precisamos abrir essas barreiras e quebrar esses preconceitos para que essa informação realmente chegue nas pessoas e nas pessoas com deficiência”, assegura.
Tanto Suzeli como Tiago concordam que o caminho para a acessibilidade total ainda é algo inspiracional, que falta muito a ser feito. “A comunidade surda está muito aberta à comunicação, à troca, nós precisamos trabalhar em conjunto. O nosso objetivo é o mesmo para todos. Todas as áreas e esferas, seja a medicina, a engenharia ou mesmo a polícia devem ser acessíveis, e a libras é uma língua para nos comunicarmos em todas as etapas das nossas vidas”, comenta o professor.
A coordenadora do Web para Todos completa: “Quanto mais conhecimento que as pessoas tenham das características destes 45 milhões de pessoas, mais poderemos ampliar a acessibilidade para todos os níveis. E sempre buscando parcerias com representantes das comunidades surdas, cegas ou com visão parcial e portadoras de outras deficiências. Esse movimento é conjunto e o trabalho de todos que o fará ganhar mais amplitude”, finaliza Suzeli.
Tiago Codogno Bezerra é pós-graduado em “Educação: Docência no ensino superior” pela Universidade Guarulhos-UnG, graduado em Letras LIBRAS pela Universidade Federal de Santa Catarina (2010) e em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2006). É docente do Instituto Singularidades, do Colégio Luiza de Marillac e do Instituto Educacional de São Paulo (IESP-DERDIC/PUC-SP).
Para saber mais: http://institutosingularidades.edu.br/novoportal/produto/traducao-e-interpretacao-de-libras-portugues/
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