Segundo o dicionário Atlas, igualdade significa “Falta de diferenças; de mesmo valor ou de acordo com o mesmo ponto de vista, quando comparados com outra coisa ou pessoa”. O mesmo dicionário aponta que equidade é a “característica de algo ou alguém que revela senso de justiça”. Apesar de próximas conceitualmente, as duas palavras têm diferenças sensíveis – que se potencializam quando a raça entra como qualificadora de ambas.
Professora do curso de Pedagogia do Instituto Singularidades, a doutora Waldete Tristão produziu uma vasta literatura sobre a equidade racial e o papel institucional dos sistemas educacionais. Um ponto de partida para entender o tema é importante: equidade e igualdade não são as mesmas coisas. Inclusive, o entendimento da existência das diferenças é fundamental para que a equidade exista.
“O conceito de equidade revela a presença de um senso de justiça que significa garantir que o tratamento ou a forma de agir com determinada pessoa considere suas características individuais e suas necessidades específicas. (…) Tratar com equidade é adaptar a regra para um determinado caso específico, a fim de deixá-la mais justa”, explica a professora.
Waldete Tristão utiliza uma imagem como exemplo para deixar o conceito mais nítido.
Na imagem abaixo, três crianças, de diferentes alturas, tentam assistir a um jogo que acontece do outro lado de um muro. Na igualdade, cada uma ganha um caixote. Porém somente duas conseguem ver a partida.
No conceito de equidade, a criança mais alta não necessita do caixote. Sua altura já é suficiente. Já a mais baixinha precisa de dois caixotes para ver e assim é feito. Dessa maneira, todo mundo consegue assistir.
Segundo a especialista, a questão racial é um dos desafios fundamentais a serem superados para o enfrentamento das profundas desigualdades do Brasil, considerando que, em dados absolutos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aproximadamente 56% da população é negra, somando-se as pessoas que se declaram pretas ou pardas.
A presença cotidiana do racismo estrutural se apresenta de formas diversas, perpassando dinâmicas identitárias, de relações sociais e institucionais. E a escola não fica fora dessa.
“Para que a diferença não se transforme em desigualdade, é preciso reconhecê-la, para que sua existência seja respeitada em sua história, cultura e existência, considerando-se as singularidades de cada idade”, inicia.
Ela completa: “É extremamente importante que a formação de futuros professores esteja comprometida com a educação antirracista, com foco na equidade, tornando possível a compreensão de que o racismo estrutural está presente na escola e que as ações de combate a ele devem ser compromisso de todos os profissionais que atuam na educação”.
O que não pode faltar?
Uma formação que tem a equidade racial como norte precisa pautar a temática da equidade racial, desde os primeiros semestres, e seguir ao longo de todo curso e nas diferentes disciplinas, conduzida por todos os professores, considerando-se as peculiaridades de sua área de conhecimento.
Um exercício sugerido pela professora a futuras educadoras é analisar os indicadores de escolaridade da população com recorte de raça, os dados do IBGE, que aponta que o acesso a esse direito apresenta índices diferentes, conforme o grupo racial, ou seja, 53% das crianças pretas ou pardas de 0 a 5 anos de idade frequentavam a creche ou escola em 2018, contra 55,8% das crianças brancas.
Quando se observa, a taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais, entre a população preta ou parda, encontramos o índice de 9,1%, enquanto o mesmo indicador é de 3,9% na população branca. Temos o índice de 40,3% da população preta ou parda, a partir dos 25 anos, que possui pelo menos o Ensino Médio completo. Entre os brancos, esse número sobe para 55,8%.
“De outro lado, a proporção da população preta ou parda entre 18 e 24 anos com menos de 11 anos de estudo e que não frequentavam a escola em 2018 era de 28,8%, enquanto, entre os brancos, 17,4% estavam na mesma situação”.
Quem está do lado de fora da sala de aula, fazendo a gestão escolar, também precisa mergulhar nessa missão: “É necessário reconhecer a existência de diferenças significativas nas taxas de aprendizagem entre estudantes brancos e negros e atuar ativamente para transformar essa realidade “, finaliza.
Doutora em Educação pela USP. Mestre em Educação pela PUC-SP. Pedagoga. Graduada em Letras. Atuou como professora, formadora e na gestão pedagógica e administrativa em escolas de Educação Infantil (EMEI) e Centros de Educação Infantil (CEI), da cidade de São Paulo, por 32 anos. Foi supervisora de creches. Participou de processos formativos para os educadores e gestores do Estado de São Paulo, atuando no Projeto Educando pela diferença para a igualdade, promovido pela UFSCar e Fundação de Apoio Institucional. Produziu o material Gênero e Diversidade na Escola, promovido pela UNIFESP. É membra da equipe de Educação do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT). Atuou em diferentes momentos do Prêmio Educar para a Igualdade Racial. Passou a integrar a equipe de Pedagogia do Singularidades em fevereiro de 2021.