Nos últimos anos, muito se tem falado sobre educação bilíngue, mas ainda se sabe pouco sobre esta modalidade de ensino. O que é uma escola bilíngue? É a que oferece o ensino de uma língua adicional ou uma em que todos os conteúdos são ministrados em duas línguas? O que uma instituição deve promover para ser considerada bilíngue? Como deve ser a formação do professor que atua neste contexto?
Antonieta Megale, coordenadora dos cursos de extensão e da pós-graduação em Educação Bilíngue do Instituto Singularidades, nos deu algumas respostas em palestra recente sobre o tema realizada na instituição, em São Paulo.
Com o aumento da demanda, muitas escolas passaram a se denominar como bilíngues. Como não existem parâmetros e nem legislação muito claros para essa definição, prevalece, em alguns casos, a questão mercadológica. Assim, nem todas as escolas que se proclamam bilíngues estão de fato em conformidade com parâmetros que definem essa modalidade educativa.
A escola bilíngue é aquela na qual os componentes curriculares são ministrados em duas ou mais línguas. Isso as diferencia de escolas em que existe o ensino regular de uma língua adicional. Nelas, a língua adicional é ensinada como uma matéria específica e não como meio para a construção de conhecimentos em áreas diversas.
Antonieta parte também dos conceitos do professor e linguista Jim Cumins para diferenciar as competências linguísticas e discursivas desenvolvidas por essas modalidades educativas. De acordo com os conceitos propostos pelo pesquisador, o objetivo central de um curso tradicional de ensino de línguas é o desenvolvimento de uma linguagem que permita ao aluno interagir na vida cotidiana e, o que ele definiu como BICS (do inglês Basic Interpersonal Communication Skills).
Já no caso da escola bilíngue, existe também o desenvolvimento de linguagem acadêmica, relacionada à construção de conhecimento em componentes curriculares específicos, o que Cummins denomina de CALPS (Cognitive Academic Language Proficiency).
Escola diferente, aprendizado e formação de professores também
O foco da escola bilíngue não é só a língua, vai muito além disso. O desenvolvimento linguístico, nas duas línguas, é o componente básico. A esse respeito, Antonieta explica que muitos pais não entendem que, aos 3 anos de idade, por exemplo, uma criança ainda está desenvolvendo suas habilidades linguísticas .
Antonieta usa como exemplo pais, que na ânsia de ouvirem o inglês fluente de seus filhos, se frustram ao ver que eles, nessa idade, falam, por exemplo, “bue” no lugar de “blue”, e se esquecem que o mesmo ainda ocorre em português e não se trata de um problema de pronúncia, mas sim de uma etapa no desenvolvimento linguístico de crianças dessa idade.
“Precisamos ser muito cuidadosos com o que prometemos à nossa comunidade escolar. A educação bilíngue não tem nada a ver com milagre. Estamos trabalhando para o desenvolvimento linguístico dos alunos, mas também para o aprendizado e a articulação de conteúdos, e isso leva tempo”, explica a professora e coordenadora.
Outro ponto importante na educação bilíngue é que, por ser um fenômeno recente, existe uma grande dificuldade por parte das escolas em contratar professores que detenham tanto os saberes relacionados ao conhecimento de uma língua adicional quanto aos da área de conhecimento em que trabalham.
Antonieta salienta que com a dificuldade na contratação desse profissional, muitas escolas têm optado por formar esses professores em serviço, por meio de assessorias e formações oferecidas na própria escola.
Para além do desenvolvimento linguístico, a professora explica que a possibilidade de desenvolvimento de competências interculturais é um grande diferencial da escola bilíngue. Existe, nesse contexto, a oportunidade de formar estudantes que tenham um repertório mais amplo, uma vez que eles podem ter acesso a outros discursos a que não teriam acesso apenas por meio de uma língua.
Uma oportunidade de construção
Além da boa formação dos professores, a educação por meio de duas línguas deve ocorrer a partir da construção de um currículo integrado, conforme comenta Antonieta. Uma escola bilíngue não tem dois currículos.
Há apenas um currículo, no qual as duas línguas trabalham em conjunto para a formação do aluno. Para isso, são feitas escolhas curriculares no que tange ao uso das línguas e aos componentes curriculares que serão ministrados em cada uma delas.
Com a aprovação da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), as escolas bilíngues também terão que se adequar às novas configurações, principalmente no que diz respeito a um ensino voltado para o desenvolvimento de competências e habilidades. Antonieta ressalta que o novo documento deve ser encarado como uma possibilidade de formação para todo corpo docente que deverá rever muitas de suas práticas e concepções.
Antonieta Heyden Megale é Doutora em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Mestre em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Pedagoga e Bacharel em Comunicação Social.
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