Muitas disciplinas que fazem parte do projeto curricular de formação inicial de professores, embora sejam trabalhadas por professores diferentes, em horários também diversos, podem ser desenvolvidas com mais proximidade, de forma integrada. De que forma isso pode acontecer, se a proposta curricular ainda está organizada por disciplinas, cada uma desenvolvendo, de maneira separada, seus conteúdos e, além disso, planejando seus objetivos e avaliação de forma autônoma?
Mesmo tendo uma grade de disciplinas agrupadas por semestres, os estudantes do curso de Pedagogia costumam relacionar os conceitos e procedimentos de forma espontânea. Durante as aulas, nas discussões e nas atividades que realizam, eles verbalizam com frequência situações didáticas, conceitos e procedimentos vivenciados em disciplinas já cursadas ou que ainda vem sendo desenvolvidas.
Se os estudantes já realizam conexões simples de forma espontânea a partir de experiências vividas nas disciplinas, tendo isso como ponto de partida, os professores podem planejar objetivos e conteúdos para suas disciplinas, experimentando uma relação com outros campos do conhecimento, com uma intencionalidade pedagógica de integrar.
A seguir, responderei algumas perguntas propostas pela equipe do Blog Singularidades sobre como a construção de projetos integrados pode ser feita, e de que forma eles ajudam o estudante, e seguirão sendo um excelente recurso em sua atuação profissional.
Como projetos integrados podem beneficiar a formação inicial do educador?
O futuro professor desenvolve um olhar mais amplo, integrando as partes de um todo, rompendo as fronteiras existentes entre as disciplinas, identificando que, para encaminhar problemas complexos, há a necessidade de cooperação entre as áreas do conhecimento e, de forma mais ampla, entre os campos das diferentes ciências.
Colocando o estudante de Pedagogia em contato com essas situações de aprendizagem, seu olhar será mais amplo, desenvolvendo habilidades de pensamento necessárias na solução de problemas complexos.
Assim, quando for gestor da sala de aula, poderá reproduzir esse modo de olhar e entender o mundo complexo em que seus alunos vivem. Serão mais sujeitos, relacionando-se cientificamente e relacionando os campos dos saberes.
Como foi a elaboração do projeto (situação-problema) que você e seu grupo está desenvolvendo no Singularidades?
Algumas disciplinas, embora tendo seu corpo de objetivos e conteúdos próprios, podem possuir características semelhantes. Dentro do projeto curricular a organização se dá de forma separada, mas no interior da sala de aula é possível planejar situações didáticas para que a articulação de conceitos, procedimentos e didáticas se aproximem.
No início do ano, professores do 5o e 6o semestres se reuniram para conversar sobre a possibilidade de realizar uma integração. Nesses semestres, em geral, os alunos possuem as disciplinas relacionadas à gestão: Função do Diretor e Métodos de Gestão Institucional; Coordenação Pedagógica, Gestão Educacional com Alunos e Família; Gestão Curricular, Planejamento Escolar e Projeto Educativo.
São semestres em que propostas curriculares integradas podem germinar, pois o terreno é fértil, e as condições apropriadas. Foi isso que mobilizou os professores dessas disciplinas. Muitos conceitos e procedimentos eram comuns a essas disciplinas: instituição, escola, cargos e funções, equipe gestora, conceito de gestão, tipos de gestão, liderança, procedimentos de trabalho e outros.
Como esses conhecimentos são desenvolvidos em diferentes disciplinas, os professores pensaram em uma situação-problema complexa, para ser encaminhada com a colaboração de campos diferentes de conhecimentos. A ideia era que os estudantes identificassem a necessidade de utilizarem conceitos e procedimentos comuns entre as disciplinas.
É importante destacar que cada disciplina permanece com seus conhecimentos particulares e específicos. Não é intenção, de forma alguma, haver uma fusão delas. Aliás, esse temor acaba causando uma resistência da parte de professores, que muitas vezes, agem com receio de perder seu espaço em uma determinada área do conhecimento.
Como você avalia este trabalho coletivo, no qual cada parte zela por uma parte da comunidade escolar?
Sou uma incentivadora destes trabalhos. Escutar a fala dos alunos sobre a proposta me incentiva, cada vez mais, a lutar para que esses projetos aconteçam e saiam do papel.
Quando você considera que a aprendizagem de conceitos, de valores, de procedimentos, de formas de fazer e entender o mundo ao redor se amplia e se fortalece a cada vez que o sujeito tem a oportunidade de identificar, utilizar os conhecimentos em situações diferente daquela em que aprendeu pela primeira vez, você percebe que as atividades integradas (aqui estamos usando essa nomenclatura) favorecem uma aprendizagem com maior significado, pois elas não são impostas, mas “pedem passagem” para ajudar a solução de problemas complexos, em que mais de um campo do conhecimento é acionado.
Entretanto, há um rol de condições mínimas para que os resultados sejam em parte, positivos. Os professores precisam planejar de forma coletiva e, literalmente, acreditarem na proposta.
Também é necessário que estejam dispostos a trabalhar juntos e a trocarem ideias, ou seja, o trabalho precisa ser planejado de forma coletiva. Em outras instituições, esse é um enorme entrave no desenvolvimento de propostas desta natureza.
Como apontam vários estudos, a proposição de situações-problema em todos os âmbitos profissionais – na educação com especial impacto – pode ser uma ferramenta de grande ajuda a outras escolas, educadores e redes de ensino. Desta forma, de que maneira você analisa o resultado que vocês vêm obtendo e quais as expectativas que você tem, de ajudar outras escolas que estejam vivendo este dilema do pós-pandemia?
É muito cedo ainda para avaliar o impacto da pandemia na sala de aula. Não me refiro à distância física entre os alunos, mas sim ao planejamento de atividades, de estratégias de aula. Intuitivamente, penso que algumas propostas chegaram para ficar, mas como será, ainda é prematuro afirmar. Nós, professores, temos discutido sobre isso nas reuniões pedagógicas, e tem sido interessante.
Voltando ao que aqui estamos chamando de “trabalho integrado”, penso que os benefícios ao interesse, ao compromisso e à aprendizagem dos estudantes sejam enormes. Há escolas de Ensino Fundamental que trabalham com atividades integradas, mas a questão maior, do meu ponto de vista, é entender o que, por que e como se faz.
Percebo uma dificuldade maior quando se observa o Fundamental 2 e o Ensino Médio, pela aproximação do vestibular e a presença de professores especialistas, mas, esse não é o foco agora.
Encerrando essas considerações, o trabalho com situações desafiadoras desenvolve um tipo de pensamento e de postura de pesquisador muito procurada no ambiente profissional. Para quem considera essas habilidades cognitivas importantes, o trabalho com situações complexas e reais (não fictícias) é benéfico para a formação integral do sujeito.
Maria Estela Lacerda Ferreira é pedagoga e mestre em Supervisão Pedagógica pela Universidade Aberta de Portugal Especialista em Educação a Distância, mediadora do PEI – Programa de Enriquecimento Instrumental, é professora do Curso de Pedagogia do Instituto Singularidade desde 2003.
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