Entre as tradicionais, uma das disciplinas que pode ganhar novas formas de se ensinar e aprender com a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é a Matemática. Mas para o professor Rodrigo Morozetti, que ofereceu uma oficina sobre o tema Matemática e BNCC durante o evento Portas Abertas e foi professor do curso de verão Aulas de Matemática e Metodologia STEM – BNCC na Prática, esta é uma meia-verdade. Na entrevista a seguir o professor compartilha suas expectativas com a aplicação da nova base e desmente mitos sobre o ensino desta disciplina tão apaixonante quanto temida.
A Matemática parece ser uma das disciplinas – ou componentes curriculares – que mais se beneficiará das mudanças da BNCC, por abrir novas possibilidades de formatos de aula aos professores. Você concorda com essa afirmação?
Em parte. A BNCC propõe uma visão de educação integral, colocando o aluno como protagonista ativo do processo de aprendizagem. Isso já acontece em muitas escolas e em muitos componentes curriculares, mas a base traz isso com força de lei.
Entretanto, é possível que muitas escolas adaptem o que já fazem visando seguir as habilidades, mas nem por isso foquem na aprendizagem – e não só no ensino – da Matemática. Nesse aspecto, as escolas e componentes curriculares mais tradicionais, onde habitualmente o aluno é colocado como receptor e reprodutor de conteúdos, têm uma oportunidade maior de terem suas práticas reconstruídas.
É aí que entra a Matemática: ela talvez seja o componente que menos tenha sofrido alteração de forma e conteúdo nas últimas décadas e agora há um espaço e uma motivação para repensar a forma como a enxergamos.
Que formatos você imagina que possam ser melhor aproveitados ou mesmo surgir com as mudanças?
O aluno sentado ouvindo e copiando a matéria da lousa aprende a ouvir e copiar. Mas espera-se que esse mesmo estudante depois saiba fazer e criar. A chance de fracasso desse processo é muito grande. Para formar um indivíduo autônomo e produtor de conhecimento é preciso enxergá-lo assim desde o princípio e criar oportunidades para que ele desenvolva essas habilidades.
Sendo assim, os formatos de aula nos quais o aluno é mais ativo têm mais chance de sucesso. Cabem aqui todas as siglas e espaços de metodologias ativas: STEAM (sigla para o inglês Science, Engeneering, Arts, Technology and Mathematics – ou Ciência, Engenharia, Tecnologia e Matemática no português; metodologia inovadora que trabalha com construção de modelos, robôs e programas), PBL (do inglês Problem Based Learning, ou aprendizagem baseada em problemas), sala de aula invertida, ensino híbrido, espaço maker e outras que existem ou venham a existir.
O ensino de Matemática foi sempre um dos mais rígidos e, muitas vezes, temidos pelos alunos do Fundamental e do Ensino Médio, nas gerações anteriores. O quanto isso se deve a um baixo estímulo do raciocínio matemático, coisa que as gerações Ye Z se beneficiaram mais, por meio de professores mais modernos e melhor preparados?
É muito complicado afirmar premissas sem uma pesquisa mais séria e assertiva sobre o assunto. Eu estudei na escola nos anos 80 e tive aulas de matemática com grande possibilidade de desenvolvimento do raciocínio lógico. Quando a gente coloca as coisas na perspectiva do “antes era ruim e agora é bom” e começa a querer quebrar o tradicionalismo com o discurso de que “aquilo não funcionou”, corre o risco de estar sempre partindo do zero.
Não é bem verdade que todos os professores mais antigos forneciam um baixo estímulo ao raciocínio lógico, nem que os professores atuais são mais modernos e melhor preparados. Mas sim que existe um processo constante de reflexão sobre a prática docente, e que atualmente essa reflexão tem questionado algumas práticas tradicionais que não são funcionais.
Dentro da Matemática a prática mais nociva e que mais assusta os estudantes e tem sido revista é a de busca constante por resultados exatos.
A visão de que existe um único meio de resolver um exercício ou problema e de que apenas a resposta certa importa para o aprendizado gera um clima constante de pressão e de exclusão, na qual quem não acerta as questões vai sendo visto como incapaz de aprender, como aquele que não tem raciocínio lógico.
Essa visão da Matemática vem sido questionada e isso sim pode ser um benefício para as novas gerações.
Que formatos de aula que ajudassem na formação deste raciocínio matemático – e também no espírito investigativo dos futuros alunos – os professores poderiam lançar mão?
Eu gosto particularmente do trabalho de Jo Boaler, Mentalidades Matemáticas, sobre o estudo de Carol Dweck (da Universidade de Stanford) a respeito de mentalidades fixas e de crescimento.
Segundo esse estudo, a forma como apresentamos desafios aos alunos e acolhemos suas respostas é determinante para que eles aprendam a aprender.
Rodrigo Morozetti Blanco é licenciado em matemática pela Universidade de São Paulo e mestre em teoria dos números pelo Profmat. Foi professor do curso de verão “Aulas de Matemática e Metodologia STEM – BNCC na Prática”, além da oficina sobre “Matemática e BNCC” no Portas Abertas, ambos no Instituto Singularidades.
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