Em uma escola, alunos da 1ª série do Ensino Médio, discutem alvoroçados sobre um novo game, no retorno do intervalo. De pé à frente da sala, a professora Tatiane, que ministra Matemática, observa o movimento. Com uma postura intimidadora, aguarda o silêncio para iniciar a aula, que terá como mote uma explanação sobre o plano cartesiano.
Focada na explicação sobre os eixos das abscissas e ordenadas e impaciente com a situação, impõe a sua autoridade por meio de um grito e, com todos acomodados, inicia a aula. Alunos e alunas sussurram e trocam bilhetes, enquanto simulam prestar atenção à professora. Neste momento, o sinal sonoro anuncia que todos estão liberados para conversarem sobre o assunto da discórdia fora da sala.
A hipotética situação apresentada é bastante comum, não é mesmo? Compreender as manifestações culturais juvenis permite que o educador proponha caminhos didáticos significativos, e que dialoguem com o universo juvenil.
Usar as expressividades jovens como aliadas
Para transformar as culturas juvenis em aliadas pedagógicas, educadores e educadoras precisam, a priori, entender sua natureza. Segundo José Machado Pais, existem duas formas de compreendermos estas manifestações culturais. A primeira é por meio do arcabouço social que as prescrevem, e a segunda, a partir das suas expressividades.
Uma não exclui a outra, mas se complementam. No entanto, hoje os jovens possuem instrumentos, como a internet, que lhes permite colocar-se de forma mais efetiva como produtores de cultura, ou que ressignifiquem aquilo que Pierre Boudieu e Jean Claude Passeron chamaram de “arbitrário cultural”.
Existe uma multiplicidade de formas existenciais dos jovens, variando conforme a sua classe social, localização geográfica, influência cultural etc. Cabe aos educadores e educadoras se aproximarem respeitosamente – sem hierarquizações entre a chamada cultura erudita e a popular – também de expressividades que se manifestam por meio da música, da dança, dos esportes radicais, dos saraus, dos slans, da literatura, da moda, do cinema, dos games etc.
Todas essas manifestações possuem um sentido que está basicamente alicerçado no protagonismo. Explico melhor: em um rap, o jovem tem a possibilidade de denunciar os problemas do seu território; no game, existe a possibilidade de gerenciar uma cidade ou pilotar um avião; na dança, podem expressar-se com o corpo e, nos esportes radicais, desafiar a chata rotina do cotidiano.
A escola oferece situações em que os jovens podem assumir o protagonismo? É sabido que a forma escolar pautada em uma “educação bancária”, usando uma expressão freiriana, não abre espaço para que a voz do jovem seja ouvida. Muitos deles encontram esse espaço em instituições religiosas ou até mesmo no tráfico, fato este que precisa ser levado em consideração nessa reflexão.
As graduações em Matemática e em Letras do Instituto Singularidades se preocupam com essas questões e, por isso, apresentam em seus currículos a disciplina “Manifestações culturais juvenis, que prepara os futuros docentes para uma atuação muito mais significativa e conectada às atuais demandas.
Voltando ao início deste texto, como a professora Tatiane poderia ter dado mais sentido para sua aula e aberto a possibilidade para o protagonismo dos jovens? Talvez incorporando em sua proposta de atividade elementos dos games, como pontuação e fases fosse uma boa opção.
O processo de gamificação das atividades pedagógicas permite que o aprendiz se aproprie do conteúdo conceitual, a partir de uma linguagem com a qual ele já está familiarizado e entende como desafiadora, pois abre espaço para o seu protagonismo.
Outra possibilidade poderia ter sido aproveitar o foco temático para pensar o plano como uma representação de localização de centros de jovens, distância desses pontos até a escola, ou até mesmo o trajeto mais curto. As possibilidades são variadas: o importante é encontrar uma forma de conexão com os jovens, pra dar sentido à aprendizagem.
Fernando Bianco Solano é professor das licenciaturas de Letras e Matemática do Instituto Singularidades
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