Em 2006, o dia 21 de março foi escolhido como o o Dia Internacional de Conscientização da Síndrome de Down, que é lembrado ao longo de todo o mês. A data foi criada para disseminar informações corretas e celebrar as conquistas desta parcela da população, que no Brasil é formada por 300 mil pessoas, de acordo com o último Censo.
No lugar de apenas um par, as pessoas com Síndrome de Down nascem com três cromossomos no par 21 (lembrando que as células possuem 23 pares destas estruturas, que carregam nossas informações genéticas como cor dos olhos, a altura, a formato do nariz ou o tipo de cabelo, por exemplo). Trata-se de apenas uma alteração genética também conhecida como Trissomia do Cromossomo 21.
Desta maneira, além de características físicas que, mesmo semelhantes, variam muito (olhos puxados, marcas nas mãos e separação dos dedos dos pés) as crianças com essa síndrome são plenamente capazes de aprender, se desenvolver, fazer amizades, trabalhar e serem inseridas na vida em sociedade, com o apoio da família, da ciência e da comunidade escola.
Entretanto, mesmo com o apoio das leis , dos estudos e relatórios de organizações internacionais sobre a educação inclusiva, ainda existe muita desinformação sobre esta condição, mesmo entre educadores.
Para saber que avanços já houve e o quanto ainda precisamos caminhar rumo a uma educação que inclua e respeite as singularidades dos alunos com Síndrome de Down, conversamos com Carolina Videira, coordenadora da pós-graduação Inclusão Escolar e Diversidade: questões conceituais e instrumentalização de práticas, no Singularidades. Carolina é também cofundadora da Turma do Jiló e da Escola de Impacto, ambas organizações voltadas à Educação Inclusiva. Confira a entrevista a seguir.
1 – Um estudo realizado pela Escola de Enfermagem da USP de Ribeirão Preto em 2014 mostrou que, naquele momento, muitos educadores tinham uma visão equivocada de como educadores devem ensinar alunos com Síndrome de Down, porque a maior parte deles focava nos pontos fracos e não no potencial destas crianças e adolescentes. Você vê esse despreparo ainda presente?
Infelizmente, ainda é comum encontramos essa postura dentro das escolas. Apesar da educação ser um direito universal, a escola viveu por muitos anos no paradigma da exclusão e da segregação, e ainda encontra dificuldades para superar o paradigma da inserção.
Com todos os avanços da Educação Especial e da Ciência, vemos cada vez mais a importância da Educação Inclusiva ser bem compreendida e difundida, além da formação dos professores contemplar esse saber.
Em 2020, a Unesco publicou um relatório onde a recomendação central é que todos os atores da educação ampliem seu entendimento sobre a educação inclusiva, englobando todos os estudantes, independentemente de sua identidade, de sua origem, deficiência ou de suas habilidades, o que veio em um momento oportuno, enquanto o mundo procura reconstruir sistemas educacionais mais inclusivos.
2 – Como a comunidade escolar, do corpo docente, passando pelos pais e famílias, vem melhorando a inclusão do aluno com trissomia do 21 no Brasil? Quais avanços você vem observando no quesito acolhimento?
Não podemos deixar de reconhecer que tivemos avanços importantes na esfera legal, de políticas publicas e formação continuada. Desde 2015 a Lei Brasileira de Inclusão corrobora para que nenhuma criança fique para trás, elucidando que não cabe a ninguém estabelecer limites para o potencial de aprendizagem de nenhum aluno.
É preciso investimento em recursos humanos, materiais pedagógicos e empatia para realizar um trabalho inclusivo. Também enxergamos um movimento importante das famílias dos alunos público-alvo da educação especial que, munidos de informação, não esperam apenas o acolhimento das escolas, mas também o desenvolvimento pedagógico focado em suas habilidades.
3 – Como o educador pode estimular as crianças desde a primeira infância a desenvolverem seu potencial criativo e social, além das habilidades pedagógicas? E porque o acompanhamento de outros profissionais, como fisioterapeutas e fonoaudiólogos é importante?
Conhecer as crianças é o primeiro passo, e no caso das crianças público-alvo da educação especial, precisamos conhecê-las sob todas as perspectivas.
Poder contar com uma equipe transdisciplinar (equipe terapêutica, médicos, professor especialista em atendimento educacional especializado e a família) é um grande facilitador para o educador realizar as adequações e adaptações de suas aulas.
Dessa maneira, podemos garantir um desenvolvimento escolar pleno e com equidade de oportunidade.
4 – Por meio do foco nas necessidades, singularidades progressos e interesses de cada aluno, a nova BNCC abre portas que os educadores e as escolas possam trabalhar seus currículos de uma forma mais acolhedora, inclusiva e estimulante, para que todos os estudantes trilhem suas rotas com autonomia e segurança. Que caminhos você sugere dentro da base para que isso aconteça com os estudantes com trissomia?
Acredito que a escolas devam elaborar ou reelaborar os currículos alinhados com um Projeto Político Pedagógico Inclusivo, que considere as necessidades, os interesses e as habilidades de cada estudante é o primeiro passo.
Dessa maneira as escolas assumem a responsabilidade em realizar um planejamento com foco na equidade e, assim, promover práticas educativas inclusivas. A formação continuada dos educadores, bem como a eliminação das barreiras devem caminhar juntas para garantirmos que todos os alunos tenham oportunidade e vez para acabarmos com exclusão histórica, que deixa à margem as pessoas com deficiência.
5 – Por fim, ainda que na educação básica a presença de estudantes trissômicos seja mais constante, no ensino superior essa realidade ainda engatinha. Como os professores do ensino médio, em parceria com a escola e as famílias devem estimular seus estudantes a continuarem seus estudos e estarem aptos para o mundo do trabalho?
Ainda é lenta a entrada de alunos com deficiência no ensino superior, bem como no mercado de trabalho, o que torna ainda mais importante o processo de inclusão na educação básica.
Se o aluno estiver apenas inserido na escola, ele termina a educação básica sem nenhum preparo para o ensino superior, bem como para uma vida autônoma e economicamente ativa. Os alunos precisam chegar ao ensino médio com suas habilidades bem desenvolvidas, e os professores estarem preparados para darem continuidade a esse processo.
Outra questão importante é o ensino superior também estar preparado para a chegada desses estudantes, eliminando todas as barreiras, sejam arquitetônicas, comunicacionais, pedagógicas e, principalmente, relacionadas a atitudes que impedem a entrada e permanência destes estudantes. Termino ainda citando o relatório da Unesco, de 2020: a Educação inclusiva é o único caminho para a educação de todos os estudantes.
Alô, professor: como você vem se informando sobre a inclusão escolar e que práticas vem adotando em suas aulas para que elas sejam acessíveis a todos? Conte para a gente!
Carolina Videira é coordenadora da pós-graduação no Instituto Singularidades. em CEO e Fundadora da Turma do Jiló, OSC de Educação Inclusiva. É graduada em Fisioterapia, pós-graduada em Neurologia (UMESP) e mestre em Neurociências (UNIFESP).
Para saber mais: https://institutosingularidades.edu.br/produto/inclusao-escolar-e-diversidade-questoes-conceituais-e-instrumentalizacao-de-praticas/
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